Clara e Gustavo se conhecem em um clube de Curitiba quando ela estava pensando em viajar, antes de começar a faculdade, e então se apaixonam e casam. Assim, a vida de Clara muda rapidamente. A mudança é radical, pois Gustavo se revela um homem agressivo, ciumento, possessivo, violento, ardiloso e perspicaz, com isso transformando a vida dela numa constante surpresa e esconde-esconde. Não somente de comportamentos, como também de cidades. Com o intuito de não criar laços com ninguém e, principalmente, de não deixar que a família de Clara saiba onde ela está, você vai acompanhar Cabra Cega sem ter a certeza de até quando aquela cidade fará parte dos planos de Gustavo. Em Cabra Cega acompanhamos os escondidos.
O autor - Sheila Ribeiro Mendonça

E o que a Josy achou?
Já tinha algum tempo
que eu queria ler Cabra Cega. Os motivos iam desde a simpatia que eu tenho
pelos textos da autora (costumo ler as coisas que ela posta no face, no blog,
etc) até a curiosidade pelo tema, pouco explorado aqui no Brasil.
Apesar de sermos um
país com um número gigantesco de vítimas de violência domestica, são poucos os
autores que se sentem capacitados para escrever sobre tal. Sheila demonstrar
estar entre os autores que podem lidar com o tema.
Por si só Cabra Cega já
é um livro polêmico. Mas, a forma como ele é narrado pode aumentar ainda mais
isso. O livro não tem diálogos, apenas uma narração em terceira pessoa.
Assusta, não é? Mas, garanto que consegue trazer proximidade entre o leitor e a
– pobre – protagonista.
Gustavo e Clara eram um
casal aparentemente normal, mas que mantinham algumas características estranhas,
fazendo com que ambos se tornassem pessoas que despertavam certa curiosidade
onde moravam. Trancada em casa, protegida por cortinas e proibida de falar com
os vizinhos, Clara é uma jovem que sofre pela obsessão do marido, alguém que
anda na corda bamba entre a psicopatia e a maldade.
De cara, percebemos que
dificilmente a mulher (a vítima) sabe onde está se metendo. Tanto na vida real
quanto na história. Em Cabra Cega, o agressor era um estudante de medicina e frequentava
um clube familiar. Ou seja, era acima de qualquer desconfiança/suspeita. Mas
Sheila é clara em narrar que todo maluco tem algum ponto que se entrega. No
caso de Gustavo, ele simplesmente não tinha amigos nem família. Mesmo no
casamento, não havia ninguém “da parte dele”.
“Ah”
pensamos “se Clara tivesse percebido isso
de cara, não teria passado por nenhum dos seus problemas”. Mas, tanto no
livro quanto na vida, a maioria das mulheres não tem coragem ou capacidade de
distinguir a encenação dos homens violentos. Tornam-se vitimas não só desses
homens, mas também de si mesmas. Talvez pelo lado financeiro, ou pela dependência
psicológica, o fato é que muitas mulheres sentem medo de morrer caso larguem os
agressores ou sentem pavor de envelhecer sem um macho. Triste fim de quem se
permite ser alienada pela sociedade que só da o valor para a mulher que tem um
homem do lado. Mas, isso é discussão das grandes pra outro momento.
É meio chocante o fato
de que a protagonista Clara é completamente submissa e covarde, sem voz de se
levantar. Já li algumas resenhas de pessoas revoltadas com a Sheila, como se a
autora fosse culpada pela apatia da personagem, sem saber que qualquer pesquisa
sobre o tema prova que a maioria das mulheres vítima de
namorados/maridos/companheiros são o retrato fiel de Clara.
E culpar a família? É
complicado se envolver. Isso me lembra duma história que a minha mãe conta de
quando estava grávida de mim.
Aos sete meses de
gravidez, a vizinha estava apanhando do marido, e minha mãe resolveu se meter. Ficou
tão nervosa, que teve uma hemorragia e foi levada as pressas para o hospital. Graças a Deus, não me perdeu (não estaria aqui
resenhando kkk), mas ao voltar pra casa depois de uma temporada muito difícil no
hospital, encontrou a vizinha e o marido aos beijos no portão.
Isso prova o quê? Que
Deus dá a vida pra cada um cuidar da sua.
Quem armou a própria cama
foi Clara. Ela fez todas as vontades do marido, submetendo-se a personalidade
doentia. Mesmo nas vezes que a família (especialmente a irmã), fazia menção de
se envolver e defendê-la, a personagem abria seus braços para a apatia,
aceitando seu destino. Mesmo sendo um livro curto, a trajetória da história é a
busca de Clara em, mais que lutar contra Gustavo, lutar contra si mesma.
Não vou dar spoilers, é
imperdoável, mas gostei de saber que a personagem, até o final da obra,
aprendeu seu valor.
Indico? Com certeza. É
um bom livro de estreia o da Sheila, corajosa num país de mesmices.
2 comentários:
Que resenha linda, estou emocionada com a sua resenha. A sua opinião era uma das que eu mais queria saber, ela realmente era muito importante pra mim e confesso que você me deixou feliz. Especialmente com a forma cuidadosa que conduziu ao falar de como essas mulheres se sentem. É um assunto delicado e que temos que ter cuidado ao abordar porque ele é muito particular pra cada mulher e ao mesmo tempo igual para todas, nem que seja em um período dessa agressão. Muito obrigada, eu amei a sua resenha.
Beijo, beijo!
She
Adorei o que li, e foi exatamente por comentários como esses que ando agora com Cabra Cega dentro da bolsa agora. Sou péssima com memória e se deixar eu preciso reler sempre para que possa enxergar no livro tudo o que todos estão enxergando. Virou um ritual.
Prima, sucesso!
Josiane, parabéns pela resenha.. aguçou meu apetite pela leitura e por esse mundo onde autores conversam entre si de maneira simples sem desmerecer ninguém.
Coração para as duas! <3<3
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