sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Resenha - A Profecia de Hedhen

A Profecia de Hedhen


Saga Os Tronos da Luz - Livro 1


Sinopse: Os Tronos eram forças que reinavam nos dias antigos com o título de “Luminares”, e através deles, a luz era derramada por todos os povos, espalhando sua sabedoria, justiça e paz. Mas as trevas, infelizmente, começaram a entrar naquele mundo e corromper os corações. Os Tronos foram enfraquecendo, e para manter a esperança eles criaram a Profecia, antes que sua luz fosse apagada de vez. A Profecia falava do retorno dos Tronos em dias futuros, onde este já seria dominado pelas trevas. Os três sinais dos “Luminares” estariam marcados nos corpos daqueles destinados a receber essa luz ancestral e poderosa. Dos três, um deveria assegurar o cumprimento dessa Profecia, sem se importar com as conseqüências; o outro deveria sacrificar a própria vida em troca da vitória; apenas um permaneceria oculto para sua própria segurança, pois em suas mãos repousaria o Cetro de Luz, símbolo dos antigos Tronos. Será que essas três pessoas, portadoras dos poderosos sinais, teriam forças para lutar contra o mal e trazer de volta a sabedoria, justiça e paz dos dias antigos?


A Autora
Ana Cristina Lacerda Aguiar nasceu em Fortaleza, no estado do Ceará, no dia 29 de junho de 1969. Cursou quatro anos de Teologia pelo STP (Seminário Teológico Peniel), e é licenciada em História pela UVA (Universidade do Vale do Acaraú). Atualmente trabalha como professora de História e Geografia no Centro Educacional MFQ. É também uma das idealizadoras do Projeto Pátio Artes, que visa integrar comunidades pobres no contato com qualquer tipo de arte. Entre os seus hobbys estão a paixão pela leitura, o cinema, a dança e o vídeo game, que ela adora compartilhar com as filhas. Atualmente reside em Fortaleza com as filhas Sara e Rebecca, e com os pais Airton e Ivete.

Cristina Aguiar escreve desde criança. Suas primeiras tentativas consistiam em tentar recriar diálogos de filmes que gostava. Depois, passou a criar histórias próprias tentando dar continuidade a esses filmes. Aos dezessete anos já se aventurava a fazer esboços na procura de uma história ideal. Acumulou vários cadernos com fragmentos de textos que nunca foram para frente. Viajantes foi o primeiro livro que conseguiu terminar, mas acabou encostando-o na gaveta, apesar da opinião favorável daqueles que o leram. Aconteceu o mesmo com A Tenda Peregrina, um romance juvenil sobre um grupo de jovens arqueólogos que parte em busca de um artefato bíblico. Quanto ao livro A Profecia de Hedhen, foi um sonho realizado. Ele é a soma de várias experiências que deram certo e o início de uma saga cujo terceiro volume já está sendo escrito. 







E O QUE A JOSY ACHOU?

Num país onde a literatura nacional é recheada de personagens femininas fracas, sem pulso, sem coragem e impetuosidade, onde personagens masculinos mesquinhos e carrascos são idolatrados como exemplo de masculinidade, aonde enredos chegam a nos causar sono, onde autores se inspiram em modinhas ao invés de clássicos, eis que surge um livro de capa impecável, de diagramação deslumbrante e de uma história de tirar o fôlego.


Prepare-se: A Profecia de Hedhen de Cristina Aguiar vai mudar sua visão sobre literatura nacional.


A história, mesmo que extraordinária, não tem como fundo algo muito diferente de outras histórias de literatura fantástica: Um mundo criado pela autora, onde o mal domina e tudo está envolto em trevas. O que faz a diferença no texto de Cristina é a forma como isso é narrado. Uma antiga profecia fala de três nascimentos onde um Rei, uma Herdeira, e uma Guardiã, irão trazer novamente a luz. Ocultando o rei por algum tempo (apesar de eu ter percebido quem é ele nas primeiras linhas), a autora logo nos traz Deborah (filha da antiga Rainha morta durante o parto), e Jael (neta de um ferreiro), como a Herdeira e a Guardiã. Assim que nascem, Hilda, a profetiza, as leva para uma terra de rebeldes, onde elas crescem se preparando para assumir o posto que lhes pertençam. De tal modo que chegam à idade adulta, tanto Deborah quanto Jael partem em busca de seus exércitos, a fim de unirem forças na batalha final.  


Porém, antes mesmo dessas cenas acontecerem, ainda na terra dos rebeldes, elas já enfrentam uma batalha contra o filho da atual Rainha, que descobre que a Herdeira nasceu, já é adulta, e é uma forte guerreira (tão forte que o derrotou no campo de batalha). Nessa cena, que transcorre logo nos primeiros capítulos, já dá pra notar a mão da autora em cenas de lutas e guerras. Muito bem descrito, uma narrativa impecável e rápida.


É inegável que Cristina Aguiar teve a influência de autores como Tokien, C. S. Lewis e Marion Z. Bradley. Dos dois primeiros autores Cristina captou a importância da narrativa clássica, e das descrições impecáveis. De Marion, veio a capacidade de criar personagens femininas fortes e honradas. Mesmo com a tarefa diante de si, tanto Jael quanto Deborah, apesar de humanas e, consequentemente, tendo defeitos, permanecem com a postura inalterada diante da seriedade da missão que as aguarda.


Jael é impetuosa como uma égua selvagem, não tem lá muito bom senso, mas no desenrolar das páginas aprende a dominar a si mesma. E Deborah lembra bastante outra personagem de uma autora nacional (Luciane Rangel), chamada Maire, pois ambas conseguem ser fortes e aguerridas, e ainda assim são mulheres, com suas próprias fragilidades.


Porém, o que realmente me surpreendeu foi a construção de Hedhen, o mundo de Cristina. Assim como C. S. Lewis, percebo que ela captou muitas coisas da Bíblia, usando com sabedoria passagens que podem trazer mensagens profundas. A máscara da religiosidade, mesmo dos bons, é muito bem explorada por Cristina. Ora, tem o povo adorador do Pai Criador o direito de cortar a mão de alguém que rouba porque tem fome? Sendo que esse mesmo que tem fome só a tem porque os bons não lhe dão trabalho por ser estrangeiro? E tem os bons o direito de agredir uma mulher amazona (do exército inimigo), apenas por causa de sua armadura negra? Ou merece um homem de passado obscuro o direito de ser perdoado e lutar pelo lado certo.


Mesmo a decisão romântica de Deborah não veio sem antes confrontar-se com a profecia. Lembrei-me de um discurso religioso que ouvi certa vez, onde o orador dizia que devíamos perguntar a Deus, sempre, quando namoramos, se aquela pessoa é a certa para nós.


A literatura de Cristina Aguiar não é fácil. Talvez, muitos leitores sem bagagem se veem perdidos diante dos questionamentos que uma obra com tanta profundidade possa trazer, mas é um pecado dizer que não devem lê-la. Cristina faz parte do núcleo dos bons autores nacionais e deve sim ser lida, principalmente em escolas. Talvez esse tipo de literatura, cheia de mensagens e interpretações, possa trazer um pouco mais de sabedoria a uma educação que naufraga a olhos vistos.


Minha nota, de 1 a 5 é........4.


Por que diante de tudo que disse, minha nota não é máxima?


Em minha opinião, houve um pequeno “porém” no livro. Atalia, a rainha má da história.


Cristina tem um grande enredo, uma grande história, uma técnica admirável, personagens bem construídos e criatividade pra dar e vender. Porém, não tem vilã. Nas poucas linhas citadas, não dá pra visualizar Atalia. Ela é má, cruel, desumana ao ponto de mandar sacrificar crianças, e perseguir e cegar a própria sobrinha. No entanto, não sabemos os porquês, nem o que carrega em sua alma. Não falo dos outros vilões, eles não me trazem interesse, mas simplesmente fiquei esperando por um capítulo sobre Atalia que não veio.


A história só tem um lado. Só o lado de Deborah e Jael. Simplesmente Atalia é narrada como um monstro, mas não existe justificativa para tal. Assim como na história da Igreja cristã através dos tempos, apenas quem adora o Deus-Pai têm direitos, podendo avassalar tudo em nome do seu deus? Qualquer outro adorador de outro deus é errado e tem que ser destruído?


Na verdade, fiel a forma “torkiana” de narrar, Cristina desempenhou seu papel. Mas, eu sempre pensei como o autor Kiril Yeskov (autor do livro O Ultimo Anel, que mostra o outro lado da história de Tolkien), onde todas as guerras têm dois lados, e ambos os lados tem suas razões e loucuras.


Enfim, pano pra manga, não? E somente livros bons de verdade causam isso, causam essas discussões infinitas e interpretações variáveis.


Não deixe de conhecer a obra.